Cinzentos são os meus dias, cinzento é o céu que me cobre, cinzento é a cor da alma macerada que me amortalha! Cinzento só e apenas cinzento!
É a manhã que teima em não brilhar! A tarde escura e desesperançada! A noite prenhe de estrelas turbulentas de angústia!
Como é que se muda de cor? Mesmo para branco e preto, como é que se muda?
Basta querer? E como é que se quer, quando o cinzento é a cor preferida da alma?
Espera-se pelo sol na alma? Aceita-se o cinzento? Tolera-se o cinzento? Espera-se com esperança sem tempo?
E como é que cheguei aqui? Que passos transviados aqui me conduziram?
E, no entanto, sobrevivo! O sangue corre nas minhas veias!
E chega sobreviver? E a vida vivida, para onde foi? E a alma? E o sol? E o desejo? E o amor?
Olho sem ver, ouço sem ouvir, toco sem sentir!
Até quando? Até onde?
De onde venho? Para onde vou? O que fiz, sem fazer? O que sinto sem sentir? O que desejo sem querer?
Quem me pintou de cinzento? Ou deixei-me pintar?
De que serve o cinzento, quando a pele me é estranha?
Porque triunfou a desconfiança?
Podia ter sido diferente?
Porquê perguntar todas as perguntas do mundo?
Tive-te sem te ter, tiveste-me sem me ter! De que valeu?
Se valeu, não vale!
Não voltes! Não serás bem vinda! Não te quero!
Não quero a raiva! Não quero a ira! Não quero o desengano! Não quero a tristeza!
Quero a paz, a luz, a alegria, a pureza!
Quero a minha alma!
Quero a minha vida!
Quero o sonho!
Quero o amor!
E basta querer?
E como é que se quer?
E, no entanto, sobrevivo! O sangue corre nas minhas veias!
Será que ainda poderei ver, ouvir, sentir?
Será que a paz, a luz, a alegria, a pureza, a alma, a vida, o sonho, o amor, todos juntos, poderão estar mesmo aqui ao meu lado, à espreita, à espera de um sinal?
Não voltes! Não serás bem vinda! Não te quero!
Não quero a raiva! Não quero a ira! Não quero o desengano! Não quero a tristeza!
Se valeu, não vale!